segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Clareira


   Depois de uma tarde longa escalando barrancos, desviando árvores e contornando terrenos impossíveis, finalmente chego à clareira. O chão é plano, acolchoado por uma grossa camada de grama verde-acinzentada e rodeado de flores selvagens e coloridas. Em volta, altas árvores que dão espaço apenas a uma pequena área na qual escapa a intensidade do sol. Esquilos correm de um lado a outro enquanto carregam nozes nas bochechas enormes. Pássaros cantam em uma cacofonia estonteante. Com certa dificuldade, armo a barraca e junto alguns galhos secos para a fogueira. A noite se aproxima e com ela, o frio. Depois de acender a fogueira, me deito ao lado do fogo e viajo.
   Talvez minha vida não seja exatamente da maneira como pensei que seria. Sempre tive em mente que a solidão era conseqüência do tempo e idade em que vivia, mas conforme as coisas foram passando, continuei sozinho. Nunca procurei um amor, pois sempre acreditei que ele viria no momento certo. Acho que me enganei. Viver aventuras sozinho é como ter um dom e não poder dividi-lo com o resto do mundo. É como ter muito e não ter com quem compartilhar. É como não sonhar.
   Cansado de pessoas superficiais, venho acampar. Gosto de me afastar do mundo urbano, uma vez que esse não tenha seguido minhas expectativas, e me aproximar de mim mesmo. Queria muito poder dividir essa explosão de sentimentos com alguém. Poder me entregar de corpo e alma a quem me ame de verdade. Tenho tanto para dar. Só gostaria que alguém apertasse minha mão firme e seguisse o caminho junto a mim, sem soltar jamais. Queria poder aprender a andar de novo, de forma diferente e adaptada aos passos de um grande amor. Sim, ainda sigo a expectativa de encontrar quem me complete. Quero amar, viver intensamente e fazer do meu amor, a pessoa mais feliz do mundo. Quero abraçá-lo firme e demonstrar tudo que sinto. Não deixarei nada passar, pois tudo deve ser vivido.
   Corujas começam a fazer um som assustador enquanto as sombras das árvores formam imagens perturbadoras no chão. Tão acostumado com tudo, jogo um balde d’água na fogueira e vou tateando a terra até a barraca. Então me deito com a porta aberta e fito a fraquíssima luz do luar que, de forma tímida, aparece no topo da clareira. Ao som da natureza, meus olhos pesam e, relutante, me entrego a um sono profundo e tranqüilo no meio do nada.


terça-feira, 18 de setembro de 2012

Chamada

   A chuva cai em grande quantidade e grossas gotas esbarram contra a janela do meu quarto. Tudo ao redor se encontra escuro e a única coisa visível é parte do meu corpo que se ilumina cada vez que cai um relâmpago. Audível era apenas a tempestade e, em certos momentos, minha respiração profunda. O cheiro do meu perfume se faz no ar e acaba misturado com o aroma de creme dental.
   Enquanto penso longe, o celular toca me trazendo de volta à realidade.
   -Alô.
   -Oi, meu amor.
   -Ah, oi. Tudo bem?
   -Tudo. Só liguei pra te dizer que te amo e que tu me faz a pessoa mais feliz do mundo. Liguei porque é em ti que penso todas as manhãs, tardes e noites. Antes de dormir, te imagino aqui comigo, abraçado, e logo pego no sono. Se tenho tido sonhos, é por tua causa. Se tenho tido bons motivos para levantar todos os dias feliz, é porque lembro que te tenho só pra mim. Sim, minha felicidade se resume a uma só pessoa. Todos os meus planos incluem 'nós'. Bem... Te deixarei dormir. Achei que valeria a pena te lembrar de tudo isso. Boa noite. Te amo. Um abraço bem apertado e um beijo na bochecha direita.
   Chamada encerrada. A chuva continua caindo, mas dessa vez com maior intensidade. Um sorriso se desenha em meu rosto e uma lágrima de felicidade escorre na minha face, agora corada. Desta vez, é real. Desta vez, é amor.


domingo, 16 de setembro de 2012

Abraço

   O sol se fazia no centro da imensidão azul. Seus raios vinham forte, cegando quem se atravesse a olhar para cima. Estávamos eu e uma amiga deitados na beira da praia, onde a areia era fina e quente, assim como tudo ao redor. Pessoas bonitas passavam de um lado a outro enquanto falavam uma bobagem qualquer e a alegria exalava de todos os cantos, não dando lugar para qualquer resquício de tristeza. Aves gritavam e cantavam ao longe.
   Ergui a cabeça e vi um grupo de amigos se aproximando. No meio a tantos rostos desconhecidos, algum especial. De forma totalmente inesperada, vi alguém que considero tanto. Me levantei e fiquei fitando-os com o objetivo de ser visto. Seus olhos vieram de encontro aos meus e seu rosto tornou a se voltar para frente, me ignorando. Como se tivesse levado um murro, fiquei com uma expressão de decepção. Tornei a fitá-los quando, de forma súbita, seu corpo se voltou ao meu com um sorriso que se desenhava como com o objetivo de mostrar todos os seus dentes perfeitos. Correndo, veio até mim e me abraçou apertado, erguendo-me do chão. Olhamo-nos nos olhos e encostamos as testas, uma na outra. Com os dedos entrelaçados, caminhamos de encontro ao horizonte.


domingo, 9 de setembro de 2012

Sonhando um possível futuro

   Entro no prédio e subo as escadas enquanto preparo a chave na posição certa. No escuro, vou tateando até que encontro a fechadura. Com certa prática, rapidamente destranco a porta e entro na pequena sala. A janela se encontra aberta e uma forte brisa invade o local. Um estímulo nervoso atravessa meu corpo e arrepia minha pele. Rapidamente encosto o vidro e tudo se acalma. De repente, sinto o cheiro do meu perfume. Ainda no escuro, sigo até o quarto.
   Algo inesperado acontece. Pela fraca luz que vem da rua, vejo aquele corpo deitado em minha cama. O corpo lindo que eu tanto desejei. Como se esperando por mim, o seu rosto se vira de encontro ao meu e nossos olhos se encontram. Com lentidão, a silhueta mal iluminada se levanta e vem em minha direção. Com força segura minha cintura e respira na minha boca. Sinto seu hálito que se mistura com o meu, formando uma onda de vontade incontrolável. Tira a minha camiseta e sem pressa, chega perto do meu ouvido e morde minha orelha com carinho. Aperta seu corpo nu contra o meu e me faz sentir seu corpo quente.
   No momento, tudo que quero é fazer parte de um só corpo com aquele ser magnífico que acaba com a minha razão e confunde meus sentidos. De súbito, sou surpreendido. Sua língua contorna meus lábios e sua boca brinca com a minha. Numa sintonia perfeita em que mistura o desejo com o sentimento, me sinto realizado. Foi tanto tempo esperando um momento que não poderia estar sendo mais perfeito.
   Dessa vez a brisa forte escapa pela janela do banheiro e invade o quarto, arrepiando mais uma vez meu corpo, agora despido. Como uma facada, acordo assustado. Um sorriso se desenha no meu rosto e expõe a felicidade que alguém, que mesmo morando longe, provoca em mim. Fecho a janela do quarto, dessa vez acordado, e tento desesperadamente voltar para o mesmo sonho.